A Cartinha da Dona Nata


Tive a honra de conhecer Dona Nata, a rezadeira de Vargem Grande, em uma tarde agradável em sua casa, em 2011. 

Dona Nata era uma pessoa encantadora, de uma bondade incrível, própria daqueles que se dedicam ao bem estar do próximo. Trabalhava sem parar, atendia cerca de 30 pessoas por dia, que não paravam de chegar em sua casa. Nunca cobrou um centavo pelas suas rezas, e recebia doações em alimentos e serviços de quem atendia.

Rezava quebranto, mau-olhado, cobrero, espinhela caída, responso e falso amigo. Me contou que na época de carnaval a fila dobrava em sua porta, todo mundo pedindo proteção para a farra e a bebedeira.

Quando fui visitar Dona Nata contei do meu projeto de resgate da memória da região, e ela ficou maravilhada com a idéia. Cheguei a filmar seu depoimento e espero um dia poder editar este material e muitos outros, que venho coletando ao longo destes anos.  

Agradecida pela minha iniciativa e na intenção de colaborar com o projeto Sertão Carioca, Dona Nata me escreveu uma cartinha contando um pouco da sua infância, o que me emocionou bastante.

Reproduzo aqui um trechinho desta carta, que ela sirva para todos nós refletirmos sobre a necessidade de preservação deste jeito rural de viver, mais generoso com o meio ambiente e com o próximo.

Salve, Dona Nata! Você deixou muitas saudades.

texto e foto: Rosa Bernardes


Minha vida contada por mim mesmo

Eu tive uma infância muito pobre mas mesmo assim me sentia feliz, nascida em Vargem Grande era muito vazia, só existia uma escola, dois armazéns e uma sede de carnaval, ruas sem asfalto, barro, lama. Mesmo assim estudei até a quarta série era muito inteligente participava de teatrinhos que as professoras faziam elas tinham grande adoração por mim. (...) Meu pai me levava para os bailes familiares, festa junina eu participava de quadrilhas era chamada rainha do forró, era cheia de saúde. Estudei até a quarta série meu pai achou que eu já sabia ler e escrever tinha que ajudar minha mãe em casa, naquele tempo o café tinha que se catar no mato e secar torrar socar no pilão de madeira. Eu torrei o café e peguei um golpe de ar fiquei resfriada e escutando baixo. O açúcar era cana passada na moenda, tirar o caldo para fazer o café, já pensou num café de caldo com aqueles bejus que a mamãe fazia que delícia que agora não se vê mais. (...) Depois que meu pai e minha mãe faleceram, minha mãe era espírita e meu pai rezador, três anos depois da morte dele, eu dormia tinha alguém que me acordava falando que eu tinha de fazer, eu sentava na cama e escrevia tudo que me falavam, fiquei com esse dom da reza aí minha vida se transformou, melhorei de tudo eu não cobro o que eu faço mas muito me ajuda e eu agradeço que foi uma obra de Deus que eu recebi. (...) Santa Catarina livra da falsidade, Santa Luzia protetora da vista, Nossa Senhora do Parto protetora das grávidas, Nossa Senhora da Conceição protege os inocentes, Nossa Senhora da Guia guia nosso corpo, Nossa Senhora Aparecida padroeira do Brasil, assim por diante, todas são a mãe de Jesus a Virgem Maria.

Nathalia Mesquita (Dona Nata)


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